Por que tanta gente ama odiar Jota Quest? Injustiçada, banda sempre fez bom pop romântico


Por que tanta gente ama odiar Jota Quest? Injustiçada, banda sempre fez bom pop romântico
Ah, o Jota Quest. O que dizer sobre essa banda mineira que muitos ainda insistem em subestimar? Fazer pop rock romântico não é tão fácil, extremamente fácil. A ideia do quinteto sempre foi falar com o maior público possível, por meio de pop rocks dançantes, baladas simples e canções com uma pegada soul.
Mas por que um grupo de pop rock dentre tantos foi escolhido para ser um dos mais achincalhados do Brasil? Como o Jota Quest se tornou um alvo de quem diz só dar valor a álbuns mais conceituais de Paralamas, Pato Fu, Los Hermanos… na hora de aceitar um pop rock mais comercial, o limite parecia ser o Skank.
Para mim, odiar Jota Quest é um exagero. Você pode não gostar da presença de palco do vocalista Rogério Flausino ou não ser fã das letras apaixonadas dos hits da banda. Mas é injusto não admitir o óbvio: o grupo toca bem, sabe o que quer e criou músicas que grudam na cabeça, fazem dançar e embalam casais.
Em uma das vezes em que entrevistei Flausino, perguntei por que ele achava que a banda era tão criticada. Quando, afinal, surgiu esse ódio? Ele concordou que o clima começou a pesar em 2001, depois de uma propaganda para a Fanta Laranja. “Ganhamos uma puta grana na época. E era tabu fazer comercial”, ele explicou.
“Naquele momento, o Jota Quest estava muito bombado, tínhamos vendido um milhão de cópias, estávamos superexpostos, o negócio foi ficando meio ‘over’. ‘Fácil’ e ‘O vento’ tocaram muito. Quando saiu o comercial da Fanta, juntou a fome com a vontade de comer. A galera falou: ‘nossa, vamos arregaçar esses moleques’.”
Rogério Flausino, vocalista do Jota Quest, em quatro fases da carreira: dos anos 90 até o visual recente
Divulgação
Essa “galera” não era o público. Eram jornalistas e críticos que passaram a desqualificar tudo que a banda fazia. Eu lembro bem dessa mudança de tom. O Jota Quest era celebrado como uma banda divertida, com bons músicos e uma cover elogiada de “As dores do mundo”, do mestre do soul funk brasileiro Hyldon.
O romantismo exagerado já apareceu nas primeiras letras escritas por Flausino, como na do primeiro hit, “Encontrar Alguém”. Ela tinha versos como “Tua alma leve como as fadas / Que bailavam no teu peito / Tua pele clara como a paz / Que existe em todo sonho bom”. Mas o primeiro álbum de 1996 também tinha canções menos óbvias, como “Onibusfobia”. Cheia de trava-línguas, versava sobre o medo de estar em um ônibus lotado: “Jacarepaguá é longe pra caramba / Jacarepaguá só se eu tiver de carro”.
“Existe meia dúzia de emburrados que dizem que não querem fazer sucesso. Não existe nada pior do que ouvir um grupo em que as melodias são as mesmas”, resumiu Flausino. Ele defendia a melodia acima de tudo. Como diz a música que fez a banda mudar de patamar, a banda queria “uma canção fácil, extremamente fácil, para você e eu e todo mundo cantar junto”.
Seu Jorge gravou “Na moral” com a banda e, recentemente, perguntei a ele por que a banda viveu esses momentos de perrengue. “Porque eles preferiram ser ingênuos”, ele respondeu, pensativo. “Não tem aquela picardia que se espera da música pop, que tem que ser uma coisa ácida. Eles são agridoces”, definiu o cantor. Para Seu Jorge, pesava contra ainda o fato de o grupo ser romântico, um adjetivo nem sempre bem recebido pela crítica, segundo ele.
Foto da capa do primeiro álbum do Jota Quest, de 1996
Reprodução
Como medir a relevância de um artista sem falar de experiências pessoais? Um caminho é falar de premiações. O Jota Quest já ganhou VMB (a premiação de clipes da MTV) e Prêmio Multishow, mas o destaque fica por conta de duas estatuetas no Grammy Latino: Melhor Álbum de Pop Contemporâneo Brasileiro em 2011 e Melhor Álbum de Rock Brasileiro Ao Vivo em 2013. Os dois gramofones dourados deixam claro: eles transitavam entre rock e pop como quem muda de roupa.
As trilhas também ajudaram a popularizar a banda. Lembro dos cinco tocando “Sempre Assim” no clássico “Zoando na TV”, estrelado por Angélica. Em 2003, “Só Hoje” foi tema do casal Solene e Beto na novelinha “Malhação”. Não só por isso, a balada se tornou a mais ouvida da banda no Spotify em todos os tempos. Assim como “Mais Uma Vez” e “Carta de Amor”, a letra nasceu de bilhetes amorosos da ex-namorada de Flausino, a escritora Fernanda Mello.
Outro colaborador frequente é Wilson Sideral, irmão de Flausino e praticamente o sexto integrante do Jota Quest. Nas parcerias com o Jota Quest, a simplicidade sempre deu o tom, como em “Fácil”, maior hit dele gravado pela banda. A música é uma espécie de editorial das intenções do Jota Quest. “Falar é complicado, baby”, canta Flausino.
Não, o Jota Quest não quer complicar. Se quisesse, não teria cantado os versos de “Amor Maior”, outra com Sideral: “Eu quero ficar só / Mas comigo só eu não consigo / Eu quero ficar junto / Mas sozinho só não é possível”. Já vi muita gente criticando letras do Jota Quest pelo prazer de criticar, mas se os versos aqui citados fossem, sei lá, dos Tribalistas ou do Titãs, ninguém encheria tanto o saco.
O Jota Quest: Márcio Buzelin, Marco Túlio, Paulinho Fonseca, Rogério Flausino e PJ
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Não era raro a banda escrever só a parte musical e convidar letristas. “Tele-fome” é do poeta mineiro Paulinho Pedra Azul: “Não adianta falar de amor ao telefone, isso é ilusão / Pra que tanto telefonema se o homem inventou o avião?”. Há outros exemplos. “Dentro de um abraço” foi criada a partir de um texto da escritora Martha Medeiros. “Tudo está parado”, por sua vez, surgiu de uma sequência de mensagens no celular enviadas por Humberto Gessinger (ex-Engenheiros do Hawaii).
Mas quando se quer falar mal das letras do Jota Quest arrisco dizer que a campeã de citações é “Do seu lado”, do refrão “O amor é o calor que aquece a alma / O amor tem sabor pra quem bebe da sua água”.
Em uma entrevista com Nando Reis, autor dessa letra, ele me disse não entender as críticas. “Você já bebeu um copo de água quando estava com muita sede?”, ele perguntou, obviamente de maneira retórica para defender seus versos. Nando disse ser “quase barroco” ao escrever. “Gosto de imagens e elas estão a favor de uma coisa muito objetiva: a necessidade de expressar os sentimentos”, definiu. O Jota Quest, definitivamente, não tinha medo de fazer isso.
A formação completa do Jota Quest com direito aos músicos de apoio em 2025
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